segunda-feira, 14 de maio de 2007

Uma História de malversação de dinheiro público

* Evaldo Viana
No início do ano passado conheci a comunidade de São Francisco do Puraqué, localizada na confluência da barragem de Curuá-una. Nela residem aproximadamente 350 pessoas que se ressentem de não receberem a necessária assistência da prefeitura que, reiteradamente, tem ignorado os apelos feitos para a ampliação da escola municipal, construção de um poço artesiano comunitário e de um mini-posto de saúde. Estas são as principais reivindicações da Dona Joana, presidente da associação que representa a comunidade.
As justificativas dadas pelo governo da prefeita Maria do Carmo para o não atendimento do pleito da Dona Joana e, com certeza, de muitos outros líderes comunitários, é a de que não há recursos suficientes para atender a tantas demandas, a tantos pedidos.
Mas esta alegada escassez de recursos públicos, ao que parece, é fenômeno desconhecido de algumas Secretarias da prefeitura de Santarém, pois nestas, o que há, é muita opulência e esbanjamento, notadamente naquelas que não tratam de coisa nenhuma como a perdulária e inútil Secretaria de Governo.
Esta Secretaria, que funciona como um adiposo e volumoso apêndice do gabinete da prefeita Maria do Carmo, gastou, em 2006, R$ 6.823.271,03 (seis milhões oitocentos e vinte e três mil duzentos e setenta e um reais e três centavos). Em quê? Para quê? Com o quê, com quem e por quê? Vejamos então como a SG e o gabinete da prefeita torrou essa montanha de dinheiro:
R$ 3.158.388,60 foram destinados ao pagamento de pessoal e seus respectivos encargos sociais. Até abril de 2006 estavam vinculados a esta secretaria 104 servidores, número muito próximo dos famosos 101 assessores do gabinete da prefeita. Em dezembro do mesmo ano esse número pulou para inacreditáveis 217. Se a prefeita decidisse construir um espaço no qual caibam todos estes assessores seria necessário um prédio com no mínimo seis andares.
R$ 2.191.671,90 (dois milhões cento e noventa e um mil seiscentos e setenta e um reais e noventa centavos) foram destinados ao pagamento da empresa Vanguarda Publicidade pelos serviços de divulgação em mídia ou, como melhor é conhecido, pelos serviços de propaganda de promoção pessoal do governo e da prefeita Maria do Carmo.
R$ 497.257,24 foram gastos e classificados como “Outros serviços de pessoas jurídicas”, nos quais merecem atenção as despesas realizadas com locação de veículos (R$ 160.232,00); passagens aéreas (R$ 109.280,11); e telefonia fixo e celular ( R$ 96.395,61). Os demais gastos desta categoria foram com hotéis, serviços de fotografia, funerária, táxi aéreo, serviços de som e com a empresa Tropardi Estudos Qualitativos para a qual a Prefeitura destinou R$ 59.870,00.
No tocante aos serviços de propaganda, passagens aéreas, telefonia e locação de veículos a prestação de contas encaminhada ao Tribunal de Contas dos Municípios tomou o cuidado de contar uma história que não fosse exatamente uma mentira, mas que também não revelasse a correta e exata classificação conforme determinado pelo Plano de Contas Único do TCM.
Por meio desse artifício, os serviços de telefonia fixo e celular que deveriam receber, conforme o Plano de Contas Único, a classificação 33.90.39.47.00 foi apresentado com a 33.90.39.99.00, que significa tão somente “Outros serviços de Pessoa Jurídica”, o que não diz absolutamente nada sobre a natureza e especificidade do serviço.
O mesmíssimo fenômeno de transmutação na especificação das contas ocorreu com os serviços de “Locação de veículos”, “Passagens aéreas” e “Publicidade e Propaganda”, para os quais se ignorou solenemente a obrigatoriedade de classifica-los até a posição de sub-níveis.
E por quê? Simplesmente para não revelar ao TCM, prima facie, o malbaratamento e dilapidação dos recursos públicos.
R$ 613.633,88 foi o valor destinado às despesas com Material de Consumo. Nesse grupo de despesas destacam-se as despesas com combustível, cujo montante, apenas para abastecer os veículos à disposição do gabinete da prefeita e da SG, foi de R$ 228.169,66; (média mensal de R$ 19.014,14 ou o suficiente para comprar 7.257 litros de gasolina por mês); despesas com churrascaria (Santo Antonio), restaurantes, buffet (Coma Bem) e bares (Mascote) consumiram R$ 69.339,09; e outras mais que incluem gastos com gráfica, supermercados e autopeças.
É possível que a prefeita Maria do Carmo não saiba dessa farra com o dinheiro público? Que ignore o que se passa debaixo do seu nariz? No seu gabinete? Ignora que é humanamente impossível gastar mais de duzentos mil reais apenas com combustível dos carros que compõem a sua frota de uso pessoal e dos seus asseclas, que essa despesa é paga com recursos públicos? Desconhece que os mais de dois milhões de reais que são gastos, inutilmente, em propaganda poderiam ajudar a comunidade de São Francisco do Puraqué e muitas outras que têm problemas que exigem urgente e imediata intervenção do poder público municipal? Não sabe que as despesas com pessoal apenas do seu gabinete são absurdas e excessivamente onerosas ao contribuinte? Que é esse número monstruoso de assessores, cupinchas e asseclas que contribuíram sobremodo para que as despesas com pessoal ultrapassassem o limite imposto pela Lei de responsabilidade Fiscal?
Não. Seria injurioso supor que a prefeita de nada sabe e a tudo ignora.
Então, o que nos resta é a lamentável conclusão que temos uma prefeita que promove consciente e deliberadamente uma administração cujo norte, cujo objetivo, cujo anseio maior é o favorecimento, não do povo, não do bem comum, não do maior número, mas única e exclusivamente dos seus mesquinhos e egoístas interesses e também dos bajuladores que em torno dela fazem uma claque sempre disposta a aplaudi-la, mesmo diante de tantos desmandos e desatinos.
* é bacharel em direito e servidor público federal

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